"Então, falando ele estas coisas em sua defesa, Festo disse em alta voz:
Estás louco, Paulo! As muitas letras te levam à insanidade!"
(Atos dos Apóstolos 26.24)

terça-feira, dezembro 02, 2008

Theology in Peanuts

Fonte: www.trincoll.edu/depts/csrpl/images/Peanuts.gif

segunda-feira, novembro 03, 2008

Karen Carpenter

Enquanto almoçava, após as aulas da manhã, tive o prazer de ouvir, pela rádio sintonizada na pensão, "Close to you", da saudosa dupla "The Carpenters". Logo pensei em Karen, de quem minha mãe me falava quando era menino. Lamentavelmente, a bela e talentosa Karen Carpenter fora vítima de anorexia nervosa, vindo a falecer em 04 de fevereiro de 1983, com apenas 32 anos.
A melodia doce da composição me abençoava, levando-me também a um estranhamento: um dia todos nós não seremos mais que uma voz gravada ou um texto escrito ou uma lembrança no coração de alguém. Ainda que as ondas sonoras que emitimos viajem eternamente pela imensidão do universo, nossas expressões escritas atravessem os séculos, as nossas biografias sejam divulgadas pelas bocas das pessoas, será apenas nessas coisas que estaremos.
Restavam-me alguns minutos antes da aula da tarde e fui pesquisar a letra da música. Uma das estrofes diz:
Why do stars fall down from the sky
Every time you walk by?
Just like me, they long to be
Close to you
A tradução é a seguinte:
Por que as estrelas descem do céu
Toda vez que você passeia?
Assim como eu, elas querem estar
Perto de você
Na letra de Karen, as estrelas descem do céu e uma pessoa caminha sobre a terra. Ela é considerada especial por uma outra que perto dela quer estar. É como se a maviosa voz de New Haven profetizasse que as estrelas e nós, outrora poeira cósmica, queremos mais: desejamos ser e ser uns para os outros. Karen não voltou a ser poeira: tornou-se música que adverte contra a indiferença que nos aliena de nós mesmos, dos outros, das estrelas, dos pássaros, das flores.
"Close to you" é um magnífico e atualíssimo capítulo do Evangelho de Karen Carpenter.
Curiosamente, 32 anos é a idade que tenho.

domingo, novembro 02, 2008

Falar sobre Deus

Ao falar sobre Deus, estranho.
Este signo que uso, Deus,
É coisa que muda como muda tudo.
A gente muda, muda o deus da gente,
Ainda que haja muita gente dizendo haver sempre um só.
Deus, palavrinha que fala sobretudo de mim,
Da minha esperança que o Ser nunca se extingua
E os seres continuem a viver nele.
Todavia, se o Ser é o Deus do meu dizer
Permanecerei sem saber.
Minha teologia, com sua palavra Deus, é possível que toque o Ser.
O mais importante, porém, é que toque os seres.
O Ser permanecerá, a minha teologia e os seres passarão.
Que a minha teologia preserve os seres enquanto durarem
E eles sejam a sua inspiração o tempo que eu durar.
Desse modo, possa eu falar de fé, esperança, caridade e Deus.
Mas ainda me é estranho falar sobre Deus.

terça-feira, setembro 30, 2008

Hermenêutica

Após a morte só há o leitor.
Não há mais pranto, nem dor,
Nem mesmo do meu sentido a cor,
Pois o texto matou o autor.

Anseio abolicionista

Olho para esta Princesa Isabel
Em relevo prata na moeda de 1 Real.
E pergunto com o olhar no vil metal
Por que ser escravo do monetário papel.

segunda-feira, setembro 29, 2008

As mulas

Vejam só esta moda que se espalha geral:
As pessoas agora dão coices como mulas.
E como as mulas ruminando capim,
Deliciam-se fazendo assim,
Regurgitando palavras chulas.
Muito fashion: o mundo ficar que nem um curral!

domingo, setembro 28, 2008

Minha cabeça!

O caminho

Jesus andava pelo campo e pela cidade
E curava, disseram depois,
Para mostrar o único caminho da salvação.
Se, continuam a dizê-lo, ignorá-lo é a perdição,
Seus bons milagres revelaram, pois,
À gente [des]encaminhada
Da humanidade pluralizada
Que o inferno é a única verdade?

Para Carla Saueressig

terça-feira, setembro 16, 2008

Condição

Meio dia e trinta;
É cedo ainda.
Vou indo [saborear],
Sob chuva e sina,
[Antes de] competir
E recrear
A orgulhosa mediocridade moderna de produzir[,]
Uma saborosa massa fina.

quinta-feira, julho 31, 2008

Escatologia realizada no Rio Grande do Sul

Os dias têm sido muito felizes, estes que venho passando ao lado da Carla. Visito o Rio Grande do Sul pela primeira vez. O frio está intenso (para alguém acostumado ao clima do Rio de Janeiro), porém o acolhimento da família de minha namorada não me deixa congelar. Instantes grandemente significativos, com muita alegria e chimarrão!

Lembrei que hoje é o último dia do mês, razão pela qual não poderia deixar de escrever, e a ocasião é das mais propícias. Carla e eu passeamos, rimos muito (ela acaba de comentar algumas gafes minhas, caindo na gargalhada), debatemos várias questões teológicas com muita imaginação e toques de ironia. Conhecer sua família e amigos neste belo lugar me faz pensar que, se somos nós que damos sentido à vida, este pode ser um dos bons. Já que somos cristãos, os dias que passo aqui, marcados pelo carinho do Sr. Ilmo, da Dona Marlize e da sua filha, representam uma realização existencial bem nítida do reinado de Deus. Tive ainda o prazer de conhecer a outra irmã da Carla, Rose, o esposo dela, Hamilton, e o filho deles, Jessé. Nos sinóticos, Jesus fala da escatologia em termos de um banquete familiar: sentar-se à mesa com Abraão, Isaque e Jacó no reinado de Deus. Carla e os seus concretizam essa escatologia. Isso sem falar em outras pessoas ligadas a eles a quem fui apresentado. Refiro-me a uma grande amiga de infância da Carla, a Marlova. Juntamente com seus pais, Sr. Ivar e Sra. Helmi, recebeu-me com muita amabilidade em sua casa. Rimos, conversamos, ceamos: nada diferente do que Jesus proporcionava aos que atendiam ao seu convite a uma vida de pregação itinerante e caridade.

Até agora fico impressionado com as coisas que a Carla fez para possibilitar que eu estivesse aqui, já que não tirei férias do meu estágio. Para poder ficar esses dias em Novo Hamburgo, precisava de acesso à internet em horários complicados, dificilmente oferecidos por lan houses. Ela conseguiu esses horários... em uma lan house! E não foi só isso: o frio e a chuva não a impediram de me acompanhar nos plantões, mesmo nas horas mais impensáveis! E se vocês pudessem experimentar o olhar terno e sereno dela...

Vai ser duro partir...

Para Carla Saueressig, família e amigos

quinta-feira, julho 24, 2008

Não adianta!

Não adianta tentarem me convencer do contrário! Qualquer pessoa, de qualquer idade, em qualquer lugar, seja adepta da religião que for (ou não tenha religião nenhuma e não creia em divindade alguma), que use de misericórdia e amor para com outro ser vivo - gente, animal ou planta - anuncia com as suas ações a presença do reinado de Deus. E Deus reconhecerá esses gestos diante de todos. Eu acredito nisso!

sexta-feira, julho 18, 2008

Disse

Faz algum tempo tenho tentado me convencer de que por mim já não há mais nada para ser dito. Quando pessoas me contam suas experiências, suas esperanças, suas crenças, ajo melhor (venho acreditando) ao ficar calado. O que move o ser humano me assusta, embora eu jamais saiba o que é. Não sei ao certo, porém acho que em uns e outros momentos quis negar isso. Negar que a energia está em todas as pessoas, de igual modo o gatilho que a põe em ação. Não se trata de ser abençoado ou não, de receber algo de fora ou não, de uma questão de adquirir isso ou aquilo, de herdar ou transmitir isso ou aquilo. A força com que o ser humano vive é a mesma que faz de quaisquer outros seres vivos batalhadores incansáveis em prol da existência de si mesmos e da perpetuação da própria espécie. Há, no entanto, em toda a constituição humana algo que ela mesma é e nunca pode deixar de ser: vontade! Esteja são ou doente, seja rico ou pobre, escravo ou pessoa livre (?), cada representante da humanidade não pode fugir da escolha.

O que é a fé? Acreditar? Em quê? Que um morto saiu vivo do túmulo? Onde reside a importância de uma coisa como essa? Da mesma maneira, qual o valor de pensar que botos viram rapazes para seduzir moças em arraiais, ou que o Anticristo já esteja entre nós, ou que Deus dará o pão amanhã, ainda que hoje não tenhamos um centavo no bolso? Sejam tais coisas possíveis ou impossíveis, a cada dia as pessoas se lançam e são lançadas em novas situações que as porão mais uma vez sob teste. A provação de ontem foi portentosa, mas ela se foi com o ontem, como folhas secas se vão ao soprar a ventania. Nossa decisão perante aquela situação também desapareceu, sendo nós chamados a decidir de novo. Decidir é tal qual avançar contra um precipício esperando encontrar uma ponte ou recuar para um terreno mais seguro. Uma e outra coisa não duram muito, pois para qualquer direção que nos dirijamos encontraremos o abismo novamente como se nunca houvéssemos prosseguido e milagrosamente (persistentemente?) encontrado (construído?) uma ponte ou então tornado atrás.

Há alguma certeza na fé? Racionalmente nenhuma. Ir atrás daquilo que não pode (e talvez nunca possa) ser visto, seja um reinado nos céus ou um paraíso na terra: pode haver alguma racionalidade nisso? A única razão que existe na fé é a razão da escolha. De uma maneira ou outra, sempre sabemos que temos que decidir. E por mais irracional que possa ser aquilo de que vamos atrás, não vamos porque nos mandaram, mas porque queremos. Não há certeza alguma na fé. O que há é a vontade. Quem quer crê, com ou sem comprovação, pois a comprovação de hoje se desfará perante o desafio de amanhã. Quem não quer não crê, com ou sem demonstração, pois esta semelhantemente o vento vai levar.

Em que você crê? Por que crê? Deram-lhe (ou você mesmo se deu) alguma certeza? Se está certo do que crê, você perdeu a fé faz muito tempo! Se a fé fosse certeza, ela não esperaria mais nada neste mundo, uma vez que, geração após geração, as pessoas são obrigadas a admitir que tudo (inclusive elas mesmas, por mais que se coloquem no centro do universo) está destinado a desaparecer. Se quisermos ser cientificamente corretos e respeitar o princípio da conservação da matéria e da energia: tudo inevitavelmente é transformado em outra coisa. Os dinossauros dominaram o planeta por milhões de anos. Onde eles estão? Viraram pedra. O que resta dos grandes impérios da antiguidade? Apenas pedaços do que já foram e cada um desses pedaços não pode responder por essas civilizações, visto que elas já foram varridas pelo tempo e seu significado morreu com elas. Tornaram-se bibelôs em exposições ou sítios arqueológicos ao redor do mundo.

Se a sua fé é fabricada de certezas, deixe-me lhe dizer que está construindo um castelo sobre areia. Por melhor que pareça o seu projeto, as condições do terreno é que vão determinar a durabilidade dele. De pó, terra, matéria somos todos feitos. Em atitude reverente perante essa condição, de inevitável transitoriedade (que nada mais é do que mutabilidade), de incômoda imprevisibilidade e de incontornável pluralidade, é que entenderemos que viver é escolher. E toda a escolha é um risco. Risco de alcançar ou de nunca encontrar o que se busca.

Qual é a vantagem, portanto, de crer em Deus ou negá-lo? De acreditar em si e trabalhar duro ou cruzar os braços e ficar lamentando a própria miséria? Enquanto quisermos ter a certeza de que Deus existe e nos receberá no seu reino após a morte, levaremos chapuletadas da vida que cedo ou tarde minarão essa certeza. E chegaremos perante o vazio que precede a escolha como sempre acontece, mas sem referência. O referencial nunca deveria ter sido Deus como certeza, porém unicamente esperança. Você nunca vai saber se Deus existe ou não, nunca vai saber em que o seu potencial vai dar, a menos que arrisque, admitindo vislumbrar no horizonte da sua visão apenas a si mesmo e deixando o coração apenas esperar por alguém que não o deixará só. Todavia, ainda que encontre Deus, você terá que procurá-lo sempre novamente, já que uma vez mais parecerá que ele não está lá. Fé é viver sem ter que constranger Deus a coisa alguma. É encontrá-lo sabendo que se vai perdê-lo novamente. É não querermos que ele nos pertença, no entanto oferecê-lo ao mundo transfigurado em corpos e paixões nossos. Quando deixamos Deus desaparecer, a fim de que tornemos a procurá-lo, ganhamos a nós mesmos. Confiar em Deus não é ter certeza da sua existência, mas arriscar ser tudo o que podemos ser, não porque isso vai nos levar a algum lugar, mas porque queremos chegar a algum lugar, ainda que nunca cheguemos ou saibamos se vamos chegar.

Deus não é certeza, só esperança. E a vida só dá uma certeza: você só pode escolher.

Arrebentem...

quinta-feira, julho 10, 2008

Mágoa

Insuportável dor
É a que dói no peito!
Será o coração?
Mais que um músculo denotativo
É o sentimento
Este, sim, asfixiado!

segunda-feira, julho 07, 2008

Geração 21

RESPEITO
RITO
ESPERO
SER
RETO
TER
PEITO
TORPES
TIRO
ESPETO
RIO
PISO
ESTRIPO
ESTIRO
TIPO
RESTO
POSE
PORTE
OPTEI
ESPREITO
REPITO

terça-feira, julho 01, 2008

Ternura à distância

Se nesta minha vida breve
Amo-te sem que estejas ao meu lado,
O teu amor
Que é intenso ainda que eu não esteja em ti
Dá-me a certeza de que a distância inimiga que nos separa
Não poderá reunir contra nós
Forças capazes de enfraquecer
O anseio desses amores distantes e predestinados
De se interpenetrarem e gozarem deliciosamente
O prazer perpétuo da ternura
Que os tornará para sempre um só.

Para Carla Saueressig
Em 26 de maio de 2008

segunda-feira, junho 23, 2008

2º Soneto

ESPIRITUALIDADE

Ó coração, por que desobedeces
E do meu comando não fazes caso com astúcia
Para me afligires com insuportável angústia
Ignorando-me as tristezas, e as dores, e as preces?

O peito arde, pois, com minúcia,
Um verdugo acusa-me e diz: “Mereces!
De lentidões e inoperâncias te entorpeces!
Méritos de condenados barganhas sem renúncia!”

Uma perfeição fria o crepúsculo vaticina da esperança
No mundo dos vencedores, da escolha fracassada
Opção pela poesia, nau dos que desistiram da bonança

Ó Mãe Celeste, por que te ocultas da alma atormentada
Distante, Espírito Todo-Poderoso, desta reles brisa sem confiança
A descrer da vida e de por ti incondicionalmente amada?

quinta-feira, junho 12, 2008

1º Soneto

CARLA

Dos lábios encanta o sorriso
Por entre o brilho dourado dos cabelos
Histórias ardentes, fascinam os anelos
Do coração pequeno de um menino sem riso

As madeixas de longos e delicados fios amarelos
Velam pensamentos profundos de muito siso
Logo revelados quais sons de um guizo
Agitado de sonhos esmeraldas escritos em olhos singelos

Que ela não esconda deste pobre a doçura
Irreprimível do colo alvo e saboroso
Da solidão abandonando-o à loucura

Apenas ame ainda que moroso
Do infeliz o coração que lhe carece a cura
E ele adormeça esperando o amanhã ditoso
Para Carla Saueressig

segunda-feira, junho 02, 2008

Nostalgia

Não sei dizer o que é a felicidade.
Todavia estou certo de que a sentia
quando tomava café com leite
nas manhãs e tardes que passava
em casa de meus avós lá por Minas.
Parece que a felicidade
já carrega em si a sua própria antítese contudo,
pois esses tempos se foram
para nunca mais voltar.

sexta-feira, maio 30, 2008

Angústia

Chove no Rio.
E eu não tenho um raio no relógio de uma torre
Que me envie para o infinito,
A fim de que eu possa compreender tudo.

quarta-feira, maio 14, 2008

Bento e Romano

Bento: - Já imaginou como seria se Deus fosse uma mulher?

Romano: - "Deus não é um humano para que minta, nem um filho de humano para que volte atrás!"

Bento: - Essa sua cultura bíblica acaba com qualquer romantismo...

domingo, abril 20, 2008

Jesus é ou representa a verdade?

Não sei no momento, sinceramente. Há uma diferença entre dizer que Jesus é a verdade e representa a verdade.

O que se quer expressar é que Jesus é o crivo da verdade quando se diz que ele é a verdade. Jesus é o paradigma na solução do problema da existência humana no mundo se é certo que a religião se ocupa dessa matéria, como a filosofia, embora em outra perspectiva. Nenhuma verdade sobre o ser humano é consistente se não passa na avaliação das palavras que se atribuem a Jesus, acompanhadas dos testemunhos que se dão a respeito dele na literatura do Novo Testamento pois. Cabem duas perguntas sobre essa possibilidade de interpretação da figura de Jesus entre muitas outras: 1) Os testemunhos do Novo Testamento referentes a Jesus necessariamente coincidem com a percepção que ele tinha de si próprio? 2) As palavras e ensinamentos de Jesus poderiam sintetizar definitiva e exclusivamente todas as possibilidades de realização histórica e existencial da vida humana, sendo ele mesmo homem, submetido aos limites de percepção da realidade característicos da condição dos humanos portanto?

A verdade se expressa de muitas maneiras, em vários lugares e tempos, através de várias pessoas, concorrendo para a perpetuação da vida, em geral, e da existência humana, em particular, conquanto inalcançável uniformemente, se Jesus a representa por outro lado. Ele seria um divulgador da verdade, mas sem a reduzir ou monopolizar. Buda, Mohammed, Moisés, Lao-Tsé, Sócrates, filósofos, poetas, romancistas, cientistas, anciãos de tribos indígenas ao redor do mundo seriam todos divulgadores da verdade em sua pluralidade e historicidade. A verdade seria reconhecida naquilo que promovesse a vida em todas as suas formas, já que a vida é tudo o que temos concretamente. Duas perguntas podem ser feitas aqui: 1) A preservação da vida constituiria o critério mais elevado acerca da verdade? 2) A pluralidade dá conta da busca do ser humano pelo fundamento último do seu ser?

Passo a bola...

terça-feira, fevereiro 19, 2008

Rascunho de uma história dos cânones das Bíblias judaica e cristã

Há, pelo menos, duas edições da Bíblia atualmente: a Bíblia judaica e a Bíblia cristã. A respeito desta última, falaremos basicamente de duas edições, a católica e a protestante.

Vamos começar com a Bíblia judaica. Ela coincide, em número de livros, com o Antigo (ou Primeiro) Testamento da edição protestante da Bíblia cristã. Do ponto de vista hermenêutico, entretanto, a sua orientação visa, provavelmente, à reverência à Torá (os primeiros cinco livros) como revelação suprema, da qual as demais partes seriam comentários. Mas como estão organizados os livros da Bíblia judaica? Em Torá (palavra que significa "instrução"), Profetas e Escritos.

Da Torá fazem parte Gênesis, Êxodo, Levítico, Números e Deuteronômio. Dos Profetas, os chamados Anteriores - Josué, Juízes, 1 e 2 Samuel, 1 e 2 Reis - e os Posteriores - Isaías, Jeremias, Ezequiel, Oséias, Joel, Amós, Obadias, Jonas, Miquéias, Naum, Habacuque, Sofonias, Ageu, Zacarias, Malaquias. Integram os Escritos: Salmos, Jó, Provérbios, Rute, Cânticos dos Cânticos, Eclesiastes, Lamentações, Ester, Daniel, Esdras, Neemias, 1 e 2 Crônicas. Passagens que introduzem e concluem estes dois últimos grandes blocos (os Profetas e os Escritos) sublinhariam a relevância da Torá atribuída a Moisés como fundamento da religião judaica (p. ex.: Deuteronômio 34.7-12; Josué 1.7-8; Isaías 2.1-5; Malaquias 4.4; Salmo 1.1-2).

Essa divisão tríplice dos livros sagrados do judaísmo parece já ser conhecida no século II a.C. No prólogo do livro Eclesiástico (ou Sirácida), o qual data dessa época, encontra-se a expressão "a Lei, os Profetas e os outros escritores". Já no Evangelho de Lucas, que deve ter sido escrito pouco depois da década de 70 do século I d.C., fala-se de "a Lei de Moisés, os Profetas e os Salmos" (Lucas 24.44). Parece, contudo, que, antes do ano 70 do século I d.C., ainda não havia um único conjunto de livros sagrados entre as populações semitas da Palestina que fosse devidamente reconhecido e aceito por todos. Os diferentes grupos religiosos possuíam os livros de sua predileção. Os samaritanos aceitavam apenas os cinco livros de Moisés (cujo texto, nos manuscritos disponíveis, difere em alguns casos dos manuscritos hebraicos que serviram de base para as edições modernas). É provável que os saduceus aceitassem os livros que hoje fazem parte do cânon, dando maior relevância à Torá, isto é, aos cinco livros de Moisés. Os fariseus decerto aceitavam todos os livros incluídos atualmente no cânon, à exceção de Ester e Eclesiastes possivelmente. Esse grupo possuía, entretanto, um conceito de autoridade que envolvia a Torá escrita e a Torá oral, sendo esta última a coletânea das interpretações jurídicas e religiosas realizadas sobre a Torá escrita.

A biblioteca dos essênios, encontrada nas proximidades do Mar Morto, em Qumran, possuía cópias em maior ou menor número de todos os livros que hoje constam do cânon (à exceção de Ester). De igual modo, produziram comentários de alguns deles, tais como Isaías e Salmos. Os dados poderiam sugerir que os essênios atribuíam maior importância à Torá e aos Profetas. Só para constar: foram encontradas cópias de outros livros, por exemplo, o Eclesiástico (Sirácida).

Entre os judeus que viviam em terras gregas, por exemplo, em Alexandria, no Egito, certamente eram aceitos todos os livros do cânon de hoje, além de outros, como os livros dos Macabeus, do Eclesiástico e da Sabedoria de Salomão, embora isso provavelmente não fosse unânime. É preciso considerar também a recepção de acréscimos de material feitos em alguns livros, por exemplo, Ester e Daniel.

As distintas comunidades cristãs aceitavam os mesmos livros básicos do cânon judaico atual e certamente usavam mais alguns, pois não havia a concepção de um cânon fechado ainda. Podemos encontrar referências a alguns desses outros livros em citações do Novo Testamento: por exemplo, Judas 14-15 (citação extraída do 1º Livro de Enoque, conhecido também como Enoque etíope).

Após a devastação de Jerusalém pelos romanos no ano 70 do século I d.C., o sínodo realizado pelos fariseus na cidade de Yavné, na região costeira norte da Palestina, por volta do final da década de 90, apenas confirmou o caráter de Escritura Sagrada da maioria dos livros do cânon judaico de hoje, sendo que essa marca de autoridade provavelmente já remontava a meados do século II a.C.

Quanto à Bíblia cristã, falemos primeiro do cânon do Novo (ou Segundo) Testamento. Nenhum dos 27 livros que o compõem foi escrito com a pretensão de fazer parte de uma coleção ou ser considerado Escritura Sagrada. A referência às cartas de Paulo (embora não saibamos exatamente quais) em 2Pedro 3.15-16 apenas sugere que as coisas começaram a mudar no final do século I e início do século II d.C. O texto de 2Timóteo 3.16 está se referindo aos livros que formam hoje o Antigo Testamento (ou, pelo menos, boa parte dele).

A partir do final do século I d.C., alguns fatores como o desaparecimento da geração dos apóstolos de Jesus e a problemática de pensamentos divergentes dos ensinamentos comuns entre as igrejas começaram a impor a necessidade da formalização de um conjunto de escritos autorizados que preservassem as memórias da vida do Senhor, os seus ensinos e as instruções apostólicas. Nessa época, precisamente a partir do século II, tornara-se igualmente importante preservar o Antigo Testamento e a sua indiscutível posição de livro sagrado para a fé cristã.

Em relação às igrejas orientais (de idioma grego), o processo de reconhecimento de um cânon do Novo Testamento se estendera até a segunda metade do século IV d.C., quando Atanásio, o bispo de Alexandria, proclamou canônicos os 27 livros que temos hoje. A lista de Atanásio serviu de referência para as igrejas romana e africana (latinas), de modo que também ali a questão já estava resolvida até o final do século IV d.C. Entre os livros considerados aqui e acolá problemáticos até essa época estão Hebreus e o Apocalipse de João. Este último, entretanto, já aparece em um documento do século II d.C., conhecido, graças ao seu descobridor, como Cânon de Muratori.

Sobre a diferença entre as edições católica e protestante do Antigo Testamento, desde o século IV d.C., a Igreja ocidental (latina) reconhecera o cânon grego do Antigo Testamento (a chamada Septuaginta), mais extenso do que o cânon judaico, pois incluía, pelos menos, outros sete livros. O reconhecimento na Igreja oriental (grega) se deu no século VII d.C.

No século XVI, os Reformadores, interessados em retornar à ueritas hebraica (a verdade do hebraico), apegaram-se aos livros do cânon judaico. Isso significa que eles não admitiram como canônicos (embora alguns, como Lutero, necessariamente não desaprovassem a sua leitura) aqueles livros que não possuíam uma redação hebraica anterior. Desse modo, ficaram de fora do cânon protestante do AT: Tobias, Judite, 1 e 2 Macabeus, Baruque, Eclesiástico, Sabedoria e as adições gregas aos livros de Ester e Daniel.

Em 1546, contudo, o Concílio de Trento estabeleceu que, para a Igreja Católica Romana, esses livros deveriam vigorar como canônicos. Por isso, ficaram conhecidos como "deuterocanônicos", isto é, "uma segunda lista" de livros autorizados. No século XVII, a Igreja oriental aceitou os livros de Tobias, Judite, Eclesiástico e Sabedoria.

Para informações mais detalhadas, vocês podem consultar:

BARRERA, Julio Trebolle. A Bíblia judaica e a Bíblia cristã: introdução à história da Bíblia. Trad. Ramiro Mincato. 2. ed. Petrópolis: Vozes, 1999. 741 p.

KÜMMEL, Werner Georg. Introdução ao Novo Testamento. Trad. João Paixão e Isabel Fontes Leal Ferreira. 2. ed. São Paulo: Paulus, 1982. 798 p.

sábado, fevereiro 16, 2008

Chique

Ir à praia porque é chique é a maior tolice de todos os tempos!

segunda-feira, fevereiro 04, 2008

22 de maio de 2008


Fonte:

http://www.omelete.com.br/cine/100009717/Indiana_Jones_e_o_Reino_da_Caveira_de_Cristal_tem_novo_poster_e_detalhes_da_trama.aspx

Ensaios sobre a expressão "Palavra de Deus" [1]

Gostaria de apresentar a vocês alguns apontamentos sobre a expressão “Palavra de Deus”. É uma expressão complexa, por isso vou tentar, a partir de hoje, apresentar alguns sentidos possíveis que podem ser percebidos nos textos bíblicos.

A Palavra de Deus pode ser percebida, em primeiro lugar, na palavra da lei. Em Êxodo 20, há uma introdução aos mandamentos do Decálogo ético. Para efeito de esclarecimento, decálogo quer dizer dez palavras. É um termo técnico, nesse caso, para os conhecidos “dez mandamentos”. A introdução de que falei é a seguinte: “Deus pronunciou todas estas palavras, dizendo” (v. 1). Compreende-se que as dez palavras que foram ouvidas por Moisés e escritas em tábuas de pedra (de acordo com Êxodo 34.28) são palavras de Deus. Por extensão, as regulamentações do chamado “Código da Aliança” (Êxodo 20.22 – 23.19) são também consideradas palavras de Deus.

Em que sentido se pode dizer que Deus falou? Segundo penso, é preciso ir além da pura identificação da manifestação de Deus com o fenômeno da comunicação verbal, própria do ser humano. A experiência no monte Sinai, seja ela tomada ou não literalmente, representa uma percepção da conduta ética como reflexo da presença de Deus entre o seu povo. Evidentemente, essa percepção é humana, portanto sujeita àquilo que é próprio do contexto cultural em que a revelação se dá. No entanto, essa percepção, conquanto humana, é testemunha de que Deus se manifestou. Os códigos de leis são produtos da dinâmica social humana, contudo se crê que Deus se expressa neles. Essa observação é importante porque por ela se pode entender que esses códigos podem e foram discutidos ao longo da caminhada de Israel com o seu Deus. Situados no tempo e no espaço, não podem prever todas as situações possíveis à sociabilidade humana. Assim, podem ser adaptados ou revistos, sem perder necessariamente o seu caráter de testemunha da revelação de Deus. Precisamente porque é o ser humano quem os cria, precisam ser vistos e revistos em prol daquilo que é capaz de contribuir para a preservação da vida e da dignidade humana, o que realmente importa em última instância. No evangelho de Mateus, percebemos em Jesus um exemplo claro de reverência pela testemunha escrita da manifestação de Deus, a letra da Lei, ao lado de uma ampliação do alcance dos mandamentos. Experimente ler e refletir sobre Mateus 5, 6 e 7. De igual modo, Jesus é capaz de reinterpretar uma lei utilizando um princípio mais amplo. Um caso é o da mulher surpreendida em adultério, conforme narra o Quarto Evangelho (João 7.53 – 8.11).

Finalizo essa primeira parte do estudo esclarecendo que a experiência de encontro com a Palavra de Deus pode se dar de várias formas, como satisfatoriamente o atestam os variados textos bíblicos: sonhos, visões, audições, textos sagrados, ritos expiatórios e de consagração, etc. É importante, todavia, entender que esses elementos não são a Palavra, isto é, não devem ser identificados diretamente com a Palavra. Eles são, isso sim, mediadores do encontro com a Palavra. A Palavra de Deus é Deus mesmo manifestando-se ao ser humano para lhe trazer a salvação. Não é sem razão que o autor do evangelho de João dirá que a Palavra habitou entre nós e vimos a sua glória. Essa Palavra, segundo ele, é Jesus Cristo (João 1.14,17).


terça-feira, janeiro 08, 2008

Crianças e brinquedos

Acabara de ganhar alguns bonecos dos Transformers. Quais eles fossem – Bumblebee, Optimus Prime, Ratchet, Ironhide, Bonecrusher, Megatron, etc. – não importa tanto. Os olhos da mãe, que dera o presente, brilhavam de satisfação por causa da alegria da criança, que manuseava freneticamente os fantásticos robôs que se convertiam em veículos.


Alguns dias e notou o menino desanimado. Perguntou-lhe o que havia. Respondeu que não tinha com quem brincar. Os robozinhos eram bem legais, ele os queria há muito tempo. Todavia, seria mais divertido se outras crianças estivessem ao seu lado para recriar as histórias daquelas espantosas máquinas orgânicas vindas do decadente planeta Cybertron. Sim, ele conhecia muito bem a trama da TV e do cinema.


A mãe ligou e chamou as primas e os primos. Eles vieram e trouxeram os seus brinquedos. Foi uma festa! Gritos, gargalhadas e, claro, algumas brigas contagiaram a casa de vida. Travavam-se batalhas épicas de mentirinha, os bons e os maus se defrontavam numa ficção em que o que morria era apenas o tédio.

– Ué, o que está acontecendo? – indagou de si mesma a mulher, percebendo que, passado o tempo, o entusiasmo ia murchando. Chegou à porta do quarto do filho e viu a criançada espalhada, um pouco aqui, um pouco ali; havia quem estivesse sozinho.

Por que não brincam todos juntos, como estavam fazendo antes? – quis saber ela.

Ah, mãe – falou o filho – cada um começou a querer fazer do seu jeito. E aí eu disse que não era assim que se brincava de Transformers. Com muito custo, consegui que todos entendessem o que eu queria. Mas aí, aos poucos, foi cada um para um lado.

A mãe foi à cozinha e voltou com um belo lanche: cachorro-quente, bolo Pullman, suco e outras coisas gostosas que vocês queiram imaginar. Depois, para quem quisesse, ela traria sorvete. Meninos e meninas se reuniram todos ao redor do que a mulher oferecera. Comendo e bebendo, muito animados, voltaram a conversar.

Terminada a comilança e retirados os pratos, os copos, as tigelas e os talheres, a meninada voltou aos brinquedos. Agora, entretanto, havia uma novidade: a mulher queria se juntar ao grupo.

Tia, a senhora vai brincar com a gente? – perguntou uma das crianças.

Menina, você acha que eu vou perder essa chance de aproveitar que vocês estão todos aqui em casa?

Ninguém mais ficou pelos cantos. E a euforia e a felicidade não pararam mais!

sexta-feira, janeiro 04, 2008

A esmo

Acabo de ler no blog de meu amigo Fábio Aguiar uma sugestão interessante. Numa postagem de setembro, que intitulou "Escolhas" (confira no link aí ao lado: "Ordenador de idéias"), ele começa falando da dificuldade que escrever é algumas vezes. Dispõe-se, então, a simplesmente ir escrevendo para ver o que sai. Resolvi tentar, embora já tenha feito algo parecido (minha postagem anterior, a última de 2007, foi um pouco assim).

Há pouco conversava com meus amigos Romão e Allany pelo MSN. Na verdade, ainda estou com eles no ar. Bons amigos. Interessam-se pelo meu bem-estar e em bater papo comigo. O Romão, já conheço há muitos anos, porém sempre temos algo para conversar. A Allany, conheço há poucos anos, mas sempre temos algo para conversar. Como gostamos de algumas coisas parecidas, geralmente Allany e eu trocamos figurinhas sobre filmes, dinossauros, viagens no tempo, vida em outros planetas, Deus e a espiritualidade, livros, música (mesmo dentro do ínfimo conhecimento que tenho sobre este assunto), desenhos, super-heróis, etc. Muita gente acharia tais assuntos deveras estranhos e até bobos. Todavia, nós não ligamos. Adoramos falar sobre essas coisas. E que não nos aborreçam!

Vi no jornal agora, à noite, que um homem equatoriano caiu de um prédio de 47 andares em Nova Iorque e sobreviveu.1 Sofreu múltiplas fraturas (é claro), mas foi submetido a cirurgias e parece já poder falar. Deve levar mais um ano até que recupere os movimentos dos membros inferiores e ande novamente. Segundo o que o jornal mostrou, entre os médicos que cuidavam dele, a palavra "milagre" foi mencionada. Até para um profissional da ciência, acho que não há termo melhor para qualificar o incidente. Todavia, mistificar o acontecimento, pura e simplesmente, não muda a vida de ninguém. Graças a Deus, o homem sobreviveu. Seu irmão, infelizmente, não teve a mesma sorte. Não sei quem é esse felizardo, nem como vivia até então. Espero, contudo, que esse "milagre" lhe incentive a seguir em busca de um bem viver, ao lado da esposa e daqueles que o conhecem.

Por falar nisso, ontem a Globo exibiu, no "Festival de Sucessos", o filme "Sinais" (Signs, EUA, 2002), do cineasta indiano M. Night Shyamalan. Ele é conhecido por articular em seus longa-metragem tanto o mistério quanto o sentido das situações que envolvem a vida cotidiana, os quais se definem pela presença do sobrenatural ou do incomum (de fato ou arquitetada). Recomendo-lhes os ótimos "O sexto sentido", "Corpo fechado" (Unbreakable) e "A vila". Em "Sinais", Mel Gibson vive Graham Hess, outrora pastor de um condado da Pensilvânia. Com ele, moram seus dois filhos, Morgan e Bo, e seu irmão, Merrill, interpretado por Joaquim Phoenix. Graham Hess havia abandonado a igreja e a fé depois que sua esposa, Colleen, morrera em decorrência de um acidente de carro, vitimada por um motorista que dormira no volante. O próprio Shyamalan interpreta o motorista.

Na trama do filme, estranhos e gigantescos círculos aparecem da noite para o dia na plantação próxima à residência de Graham. Outras figuras começam a surgir em outros lugares, seguidas de luzes que pairam sobre algumas das principais cidades do mundo, a partir da cidade do México. Uma imagem em vídeo feita no Brasil fornece a prova que faltava: uma invasão alienígena estava prestes a ser desencadeada.

Shyamalan trabalha essencialmente os rumos pelos quais o sofrimento pode nos levar: perder ou recuperar a fé. E é da perda para a recuperação que a personagem de Mel Gibson evolui quando percebe que a combinação de situações infelizes do passado e do presente, aparentemente sem sentido, corroborava para preservar a sua vida e a de sua família ante aquela circunstância sinistra. Não pude deixar de pensar na história bíblica de José (Gênesis 37; 39-50). Estando próximo o desfecho, José, ora vizir do Faraó, revela-se a seus irmãos, que ficam aturdidos. Naquilo que diz a eles, pode-se perceber a noção de destino, isto é, as ações de seus parentes que lhe causaram sofrimento concorreram para a consecução de um propósito maior, relativo à sobrevivência de toda a família do, outrora, desafortunado semita (Gênesis 45.1-8):

Então José não pôde conter-se diante de todos os homens de seu séquito e gritou: "Fazei sair a todos da minha presença." E ninguém ficou junto dele quando José se deu a conhecer a seus irmãos; mas ele chorou tão alto que todos os egípcios o ouviram, e a notícia chegou ao palácio do Faraó.
José disse a seus irmãos: "Eu sou José! Vive ainda meu pai?" E seus irmãos não puderam lhe responder, pois estavam conturbados ao vê-lo. Então disse José a seus irmãos: "Aproximai-vos de mim!" E eles se aproximaram. Ele disse: "Eu sou José, vosso irmão, que vendestes para o Egito. Mas agora não vos entristeçais nem vos aflijais por me terdes vendido para cá, porque foi para preservar vossas vidas que Deus me enviou adiante de vós. Há dois anos, com efeito, que a fome se instalou na terra e ainda haverá cinco anos semeadura e sem colheita. Deus me enviou adiante de vós para assegurar a permanência de vossa raça na terra e salvar vossas vidas para uma grande libertação. Assim, não fostes vós que me enviastes para cá, mas Deus, e ele me estabeleceu como pai para o Faraó, como senhor de toda a sua casa, como governador de todas as regiões do Egito.
2

Após a morte de Jacó, o patriarca, e por causa do temor de seus irmãos de que quisesse se vingar, José lhes reafirma a convicção de que tudo o que lhe ocorrera até ali, não obstante as más intenções dos irmãos, fora conduzido por Deus na direção de um bem maior para a estirpe de Israel (Gênesis 50.15-21):

Vendo que seu pai estava morto, disseram entre si os irmãos de José: "E se José for nos tratar como inimigos e nos retribuir todo o mal que lhe fizemos? Por isso, mandaram dizer a José: "Antes de morrer, teu pai expressou esta vontade: 'Assim falareis a José: Perdoa a teus irmãos seu crime e seu pecado, todo o mal que te fizeram!' Agora, pois, queiras perdoar o crime dos servos do Deus de teu pai!" E José chorou ouvindo as palavras que lhe dirigiam.
Vieram os seus próprios irmãos e, lançando-se a seus pés, disseram: "Eis-nos aqui como teus escravos!" Mas José lhes disse: "Não tenhais medo algum! Acaso estou no lugar de Deus? O mal que tínheis intenção de fazer-me, o desígnio de Deus o mudou em bem, a fim de cumprir o que se realiza hoje: salvar a vida a um povo numeroso. Agora não temais: eu vos sustentarei, bem como a vossos filhos." Ele os consolou e lhes falou afetuosamente.3

Não sei se destino existe. Por que coisas ruins acontecem a pessoas boas? Por que uma pessoa se torna um bandido? Por que pessoas desaparecem e suas famílias nunca mais as vêem? Por que uns se tornam bem-sucedidos e outros fracassam? Por que há pessoas que confiam em Deus e permanecem pobres e outras, que também confiam, adquirem um padrão de vida invejável? Por que alguns que têm tudo destroem as suas vidas em vícios e promiscuidade e outros, com muito pouco, vivem felizes? Por que alguns que não têm nada decidem permanecer no ócio e na precariedade e outros que têm tudo não se cansam de trabalhar e empreender ações altruístas? Por que alguém se casa com essa e não aquela pessoa? Por que, entre pessoas doentes, uns e não outros (ou todos) se curam (ou são curados)? Por que duas crianças nascem e uma vive e a outra morre? Ou as duas vivem? Ou as duas morrem? Por que há pessoas que gostam tanto de estudar, outras que se esforçam porque não gostam, mas sabem que precisam, e outras que nem gostam e nem se esforçam? Por que, numa mesma família, duas pessoas se tornam professores, e uma é mais considerada do que a outra? Por que a vida parece tão fora de nosso controle e continuamos a insistir que sabemos e podemos controlá-la?

A infelicidade do homem é grande, pois ele não sabe o que vai acontecer:
quem pode anunciar-lhe como há de ser? (Eclesiastes 8.6b-7)
4

Minha tempestade de idéias, por hoje, termina aqui.


Notas:

1 Veja em http://oglobo.globo.com/mundo/mat/2008/01/05/327894093.asp

2 A Bíblia de Jerusalém, p. 95s.

3 Ibid., p. 104.

4 Ibid., p. 1176.


REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA


A BÍBLIA DE JERUSALÉM. Nova edição, revista. São Paulo: Paulus, 1985. 2366 p.