"Então, falando ele estas coisas em sua defesa, Festo disse em alta voz:
Estás louco, Paulo! As muitas letras te levam à insanidade!"
(Atos dos Apóstolos 26.24)

quarta-feira, abril 17, 2013

sábado, abril 13, 2013

Ditadura gay?

Publicado originalmente no Facebook em 10 de abril de 2013.

Penso que a crítica que se tem dirigido aos homossexuais confunde comportamento e sexualidade. Sexualidade humana, que é inata, envolve desejos e afetos que não se restringem apenas à reprodução da espécie. Se assim não fosse, casais heterossexuais fariam sexo apenas quando quisessem ter filhos. Em vez disso, sabemos que a maioria das vezes que casais heterossexuais fazem sexo é porque se amam (no caso daqueles que assumiram entre si um compromisso) e/ou querem ter prazer. Trata-se de uma pulsão. O sexo entre pessoas, portanto, não está, nunca esteve e nunca estará circunscrito à procriação. Logo, não se trata simplesmente de uma questão biológica, isto é, para dar continuidade à espécie. Sendo assim, a ocorrência de relações homoafetivas como algo natural é perfeitamente plausível, já que se trata de sexualidade, na qual "pode estar" envolvida (no caso de um relacionamento heterossexual) a reprodução. 

Comportamento se aprende e se exerce livremente. Um comportamento pode, por exemplo, dar expressão visível a sentimentos de amor ou de violência, de perdão ou de vingança, de respeito ou de intolerância. Tanto um heterossexual quanto um homossexual podem, por exemplo, no exercício de sua sexualidade, "comportarem-se" de forma respeitosa ou invasiva, responsiva ou brutal. A sexualidade humana é inata, mas uma pessoa pode "aprender" que uma via de orientação essencial do desejo sexual é "certa" e outra "não é". Em outras palavras, pode-se considerar "comportamental" aquilo que é inato e natural quando, ao contrário, o comportamento aprendido pode concretizar, de forma saudável ou nociva, pessoal e socialmente, o impulso sexual natural, que, no caso humano, transcende a simples função de reprodução biológica. 

Tem-se criticado o(a)s homossexuais na essência da sua sexualidade e, por conseguinte, em sua luta pelos direitos decorrentes de sua pulsão inata. É como criticar um heterossexual pelo mero fato de ele(a) ser heterossexual. A meu ver, não há esse negócio de ditadura gay. O que há é gente que não aceita que o(a)s homossexuais vivam a sua sexualidade na esfera social, tachando-a de puro "capricho ou desvio comportamental". Além do mais, a Constituição Federal garante a hétero e homossexuais a proteção de suas liberdades individuais. E desse modo, segundo entendo, o exercício livre da sexualidade humana, que é inata, é resguardado dentro dos limites impostos pela lei. 

No campo do pensamento humano, convicções políticas e convicções religiosas, bem como ações sociais delas decorrentes, podem e devem ser objeto de crítica, entendida crítica como liberdade para discutir e, então, acolher ou repudiar. Convicções políticas e convicções religiosas, porém, são criação humana. Ainda que compreendidas pelos que as adotam como as mais adequadas ou mesmo reveladas por uma ou mais divindades, seu desenvolvimento, articulação e expressão continuam sendo produto do pensamento humano, que é plural e cultural. Sexualidade, embora possa ser moldada pela cultura (e aí entra o "comportamento"), é uma dimensão da essência humana que há muito transcendeu a simples reprodução biológica. O que está em questão parece ser muito mais uma tentativa de cerceamento político da liberdade dos gays de exercerem sua sexualidade (enquanto constituição essencial do seu ser) no âmbito civil.

terça-feira, janeiro 22, 2013

Sexualidade e erotismos nas tradições de Judá

Palestra "Sexualidade e erotismos nas tradições de Judá: o estranho caso das filhas de Ló", proferida por meu orientador no Doutorado em Teologia na Faculdades EST, Prof. Dr. Carlos Arthur Dreher, durante o III Congreso Internacional Ciencias, Tecnologías y Culturas. Diálogo entre las disciplinas del conocimiento mirando al futuro de América Latina y el Caribe. Hacia una Internacional del Conocimiento, no dia 09 de janeiro de 2013, na Universidade de Santiago de Chile, ocasião em que também estive presente como participante.

 
 
 
 

segunda-feira, outubro 08, 2012

BROTINHOS

Carla,
brotinhos de florezinhas vermelhas na bochecha,
mares cristalinos nos olhos,
olhos de onde brotam pomares...
Ela me deixa colhê-las,
as frutas de amor,
polpas de beijinhos!

domingo, julho 15, 2012

O amanhecer

O amanhecer é o abrir dos teus olhos,
qual sol a levantar-se na curva do horizonte,
tingindo com cores vivas a tela da amplidão.
Obra-prima da vida!

Para Carla Saueressig da Silva


quarta-feira, maio 02, 2012

BILY



Perdi um Amigo.

Eram 18h48 do último 27 de abril. Recebi um torpedo da Carla. A frase era curta. A mensagem, atordoante.

O Bili se foi.

Liguei para ela. Chorando, ela me contou. Ficamos muito tristes, muito mesmo.

O Bily era o cãozinho dos meus sogros. A Carla conviveu mais com ele do que eu, mais ou menos uns quinze anos. Conheço o Bily desde 2008, mas estive mais próximo dele a partir de 2009, quando já me mudara definitivamente para o Rio Grande do Sul.

Só tenho boas lembranças dele. Foi preparando sua comida que fui conquistando-o. Afinal, eu era recém-chegado e o Bily não me conhecia. Não demorou muito para ficarmos amigos. Ele era muito dócil.

Adorava comer e, sempre que a gente preparava a sua tigela, ele latia. Parecia dizer: "Ei, não demorem muito!" Não gostava, porém, que mexessem na comida dele. Mesmo assim, ele nitidamente tentava deixar isso claro sem nos ferir. Ele me mordeu duas vezes quando quis ajeitar o seu prato. Pelo tamanho dos seus dentes, poderia facilmente furar minha mão. Mas o que ele quis foi apenas me dizer, do jeitinho dele (procurando não machucar, já que nunca mordeu com intensidade para perfurar), que não era para mexer ali. Talvez ele também tivesse receio de que retirássemos sua comida, tamanha era a sua vontade de "papar". Todavia, estou certo de que ele acabava percebendo que lhe dar de comer também nos fazia muito felizes. Ao colocarmos o prato, ele sempre nos olhava e sabíamos que, com esse gesto, ele nos dizia "muito obrigado". No final do ano passado, a "paixão" de nosso Bily por comer provocou uma determinada situação que culminou num eficiente socorro para a Carla, quando foi diagnosticada uma doença que lhe ocosionou muito medo e mal-estar. Como ela mesma disse: "Ninguém tira de mim a ideia de que, naquele dia, o Bily, sem querer, me salvou" (Leiam o comovente relato que ela faz em sua homenagem ao Bily em http://fragmentosdeumautopia.blogspot.com.br/2012/05/bily.html).

Bily havia sobrevivido a uma cinomose anos atrás. A doença, no entanto, deixara como sequelas uma saúde debilitada e alguns tiques. Assim mesmo, toda vez que algum de nós aparecia por ali, no quintal, estivesse ele deitado ou em pé, vinha de imediato para junto. Ele gostava de acompanhar a gente. Houve ocasiões que a Carla e eu tivemos o prazer de passear com ele na rua em que ficava a casa dos pais dela. Com alguns puxões, parecia que era ele quem nos levava.

Nos últimos tempos, o Bily ganhou a companhia do Fifi, um gatinho preto que meus sogros adotaram. Bily e Fifi derrubavam completamente a ideia de que cães e gatos são necessariamente inimigos naturais. Por mais que o Fifi se irritasse em alguns momentos e batesse no focinho do Bily, este não ligava e queria continuar brincando.

Infelizmente, o Bily foi enfraquecendo. Perdeu a visão do olho direito, a audição e a força nas pernas. Por fim, o que parecia ser uma infecção no ouvido o atingiu. Sofremos muito porque ele sofria. A melhor (e mais difícil) solução acabou sendo a eutanásia. Sabemos que ele agora não sofre mais, só que nos dói muito estar sem ele. O pátio vazio é um cenário sem sentido...

Desejo demais que o Bily continue vivo num lugar onde a doença e o sofrimento não entrem. É minha esperança que ele tenha sido recebido pelos queridos da Carla e meus que também se foram. Como eu quero que eles cuidem dele e todos juntos sejam acolhidos pelo amor da Divindade! Anseio tanto que o Bily corra, brinque e lata por ver que a Divindade já prepara seu banquete! Quero muito que, um dia, ao levantar seus olhos puros para agradecer a comida, o Bily encontre os olhos eternos do Céu, mas também os meus, os da Carla e os de todos aqueles e todas aquelas que o amam!

Saudades, Amigo...

domingo, abril 08, 2012

ELISEU: PROFECIA É AÇÃO SOLIDÁRIA

Prédica proferida na Igreja Batista Central de Novo Hamburgo em 11 de março de 2012.


INTRODUÇÃO


Quero pensar sobre 2Rs 6.8-23. Trata-se de uma história do profeta Eliseu. Uma história impressionante de solidariedade em pleno contexto de uma guerra entre a Síria e Israel. Nela, quero destacar três dimensões da ação profética de Eliseu relacionadas à solidariedade.


1a) ELISEU MOSTRA-SE SOLIDÁRIO PARA COM A SUA COMUNIDADE


Percebemos que a ação profética de Eliseu é dirigida inicialmente à proteção do seu povo contra a ameaça dos sírios. Eliseu entende que a sua atividade de profeta está inserida no quadro maior da aliança do SENHOR com Israel e deve servir à promoção dessa aliança. Embora críticos ferozes de Israel em vários momentos, os profetas, como é o caso de Eliseu aqui, também põem-se ao lado do seu povo para solidarizarem-se com eles em momentos de crise.

É curioso que, em todo o ciclo de Eliseu (2Rs 2 - 13), haja várias histórias de milagres desse profeta em que grupos mais amplos de pessoas são beneficiados. Eliseu mostra que o SENHOR em nome de quem ele profetiza está presente quando há ações concretas de solidariedade do homem e da mulher de fé, ao mesmo tempo, em favor da comunidade de fé e também da comunidade secular. Digo isso porque a crise que Israel enfrentava era também uma crise política. Do mesmo modo, não somos somente pessoas vinculadas a um grupo religioso, mas igualmente cidadãos. Não basta dizer o que é que Deus quer para a igreja, o bairro, o município, a cidade, o país ou o mundo, seja consolo, justiça, recursos ou caridade. É preciso pessoalmente empenhar-se para que essas coisas aconteçam. O SENHOR dissera a Eliseu quais eram as pretensões dos sírios em relação a Israel. Mas Israel só foi salvo porque o profeta comunicou o que sabia ao rei.

Gostaria de sugerir que você pensasse modos pelos quais pode mostrar-se solidário em favor desta comunidade cristã da qual faz parte e em favor de outros grupos sociais nos quais você está inserido(a): Há atividades aqui na igreja em que você poderia ajudar? Há alguma coisa que você possa fazer para melhorar as condições de vida no seu bairro? Há pessoas e animais aos quais você poderia prestar assistência?


2o) ELISEU MOSTRA-SE SOLIDÁRIO PARA COM O SEU COMPANHEIRO MAIS PRÓXIMO


Na angústia do seu moço por causa do cerco dos sírios a Dotã, Eliseu amparou-o. O texto deixa claro que o profeta era o principal implicado naquela ameaça. Entretanto, Eliseu deixou a si mesmo de lado por um momento e foi cuidar do seu companheiro aflito.

O milagre fora incrível, sem dúvida! Imagine olhar as montanhas e vê-las tomadas por cavalos e carros de fogo! E mais, um exército tão surreal que está a nosso favor! O moço de Eliseu certamente foi confortado diante da ameaça do cerco das tropas dos sírios. Só que ele só pode ver o que viu porque Eliseu, o profeta, encorajou-o e, em seguida, pediu ao SENHOR por ele. A solidariedade de Eliseu "abriu os olhos" do seu moço para ver mais amplamente e, assim, devolveu-lhe a esperança. Eliseu ajudou seu moço a lidar com aquela situação de tensão e tranquilizou-o.

Há muitos, é verdade, que precisam de nossa solidariedade. E quanto àqueles que estão mais próximos de nós? São mães, pais, esposas, esposos, filhas, filhos, parentes, amigos, pessoas de nossa intimidade, animais de estimação que podem estar sofrendo sem que a gente dê pela coisa. Podemos achar que é suficiente dizer que precisam fazer isso ou aquilo para melhorar. Mas a solidariedade parece exigir que apoiemos esses nossos próximos fazendo tudo o que pudermos e, ainda, permaneçamos ao lado deles(as) mesmo que, no momento, não saibam, ou não consigam, ou não queiram fazer o necessário para melhorarem. Eliseu disse ao seu moço: Não temas, ou seja, tranquilize-se! Também disse: Você não está sozinho, eu estou do seu lado e há muito outros por nós! Depois, o próprio Eliseu faz algo em favor do rapaz: uma oração ao SENHOR. Em sua ação solidária, Eliseu move-se do seu moço para si. O companheiro do profeta não resolveria sua crise sozinho. Eliseu assegurou-lhe que havia três envolvidos na solução do problema: o moço, o SENHOR e o próprio profeta.

"Abrir os olhos" de nosso mais próximo aflito não é algo com que lidar como se fosse coisa qualquer, que não nos diz respeito. Envolve ser os olhos do outro enquanto este os tem (ou mantém) fechados.


3o) ELISEU MOSTRA-SE SOLIDÁRIO PARA COM AQUELES QUE LHE QUERIAM MAL


Os sírios haviam cercado Dotã para prender Eliseu. Diante daquele exército hostil, o profeta age em três etapas:

a) Fechando os olhos sírios: A primeira oração de Eliseu ao SENHOR em relação aos sírios, bastante específica, desencadeia uma cegueira nos seus adversários. É como se a atitude de Eliseu fizesse com que os sírios se deparassem com o que estava envolvido em sua ação agressiva. A hostilidade prejudica não apenas quem é hostilizado, mas também quem hostiliza. Isso desnorteia a pessoa, pois ela já não é capaz de enxergar mais nada além do mal que quer causar, acabando, no final, por ser atingida por suas próprias ações.

b) Conduzindo os sírios enquanto cegos: Eliseu leva os sírios cegos para dentro da Samaria, capital de Israel, seus adversários. O profeta procura, ironicamente, conduzi-los a "olhar mais de perto" a condição em que sua hostilidade os coloca. Isto é, através de Eliseu, os sírios percebem aonde sua agressividade vai levá-los: a mais agressividade por parte daqueles a quem têm por inimigos. Notem que o rei de Israel, logo que vê os sírios em seu poder, já quer matá-los!

c) Abrindo os olhos dos sírios (e de Israel) para que entendessem que, ao mal, responde-se com o bem: Os sírios se deram conta da enrascada em que se meteram. Foram atrás de Eliseu e caíram nas mãos de Israel. O ansioso rei de Israel, por sua vez, não podia esperar por chance melhor de acabar com a raça dos inimigos. Entre os dois lados, estava Eliseu. O profeta, porém, faz algo que surpreende os sírios e Israel. O rei de Israel, diz Eliseu, se quisesse, que matasse aqueles a quem ele próprio capturasse. Os cativos trazidos pelo profeta, entretanto, seriam alimentados e libertados. Os sírios e Israel vinham uns de encontro ao outro com ódio. Eliseu veio ao encontro de ambos com solidariedade. O último versículo do texto diz que "da parte da Síria não houve mais investidas na terra de Israel".

Solidariedade não se pratica por merecimento, mas humanidade. Não para ganhar alguma coisa, mas dar o que o outro precisa. E, mesmo que haja ódio do outro lado, os efeitos do gesto solidário podem ser incríveis.


CONSIDERAÇÕES FINAIS


Alguns estudiosos do Novo Testamento já disseram que Jesus, conforme descrito nos Evangelhos Sinóticos (Marcos, Mateus e Lucas), aproxima-se muito do estilo de Elias e Eliseu. Os três notabilizam-se pelos milagres que fazem, sim, mas também por aquilo que está envolvido em tais milagres: a solidariedade para com as pessoas. Pode-se dizer que, em certo sentido, Jesus foi discípulo de Eliseu. Como Eliseu, Jesus preocupava-se com seu povo e assistiu muitas pessoas. Como Eliseu, Jesus cuidava dos seus próximos: ele alimentou seus discípulos, ensinou-os e defendeu-os, procurando, inclusive, por aqueles que o haviam abandonado quando fora preso. Como Eliseu, Jesus não negou ajuda a pessoas consideradas indignas ou inimigas, além de não ameaçar ou reagir com violência contra aqueles que o torturavam. Jesus andou nos passos de Eliseu. Vamos junto com ele?